Monumento a Olavo Bilac

Poeta, Profeta, Patrono do Serviço Militar ou Ativista?

Texto: Karen Steinman Martini. Modelagem 3D: Beatriz Barbosa de Lima, David Atalla Aly, Laura Sayuri de Haro, Nathan Lavansdoski Menegon, Roberta Kimberly Calandrine Azevedo dos Santos, Rodrigo Simões Ferraz do Amaral. Pós-Produção: Luís Felipe Abbud, João Generoso Gonzales.

O Monumento a Olavo Bilac, foi originalmente nstalado no Belvedere da Av. Paulista, em 1922, nas comemorações do Centenário da Independência e desmontado em 1936 para a realização de obras viárias no local. A obra, de autoria do escultor sueco e professor do Liceu de Artes e Ofícios William Zadig, foi encomendada pelo Centro Acadêmico XI de Agosto, com apoio da Liga Nacionalista e do jornal O Estado de S. Paulo, em homenagem ao poeta logo após sua morte (1918). Laureava o denominado ‘príncipe dos poetas’ com um conjunto de esculturas que celebravam os seus então mais famosos poemas: Escoteiro, Beijo eterno, Pátria, Pátria e família, Via Láctea, O caçador de esmeraldas e A tarde. No topo, assentava-se o busto do próprio Bilac.

Encomendado para as celebrações do Centenário da Independência, o monumento faz parte de um período denominado por um cronista da época, lembrado por Nicolau Sevcenko, de ‘febre estatuária’. Para o busto, o escultor sueco pôs em ação seu Bilac, conhecido também como profeta do ativismo, concebendo-o com o braço erguido de um orador. O pedestal é substituído por uma grande massa, que faz a vez de um alto rochedo, em torno da qual figuras modeladas em homenagem às poesias do autor ‘Pátria’ e a coleção de sonetos ‘Via Láctea’ escalam. Em volta de seu monumento havia relevos retratando momentos decisivos da história do Brasil, em que as massas agiram como principais protagonistas.

W. Zaddig, 1922. Monumento a Olavo Bilac, à época de sua implantação na Praça dos Expedicionários (atualmente, Marechal Cordeiro de Farias, próximo à Rua Minas Gerais)

Em sua configuração original, no Belvedere da Avenida Paulista, o monumento possuia grande impacto estético e simbólico. Tal cenário era importante para as comemorações oficiais da cidade, empenhada na construção de uma nova identidade atrelada ao modernismo. À essa identidade Bilac assumia um papel central em uma narrativa construída para demonstrar um esforço vigoroso de uma conquista transcendental, em seu papel cívico e engajado no conjunto de reformas nacionalistas em vigor. Em 1915, Bilac discursou na Faculdade de Direito do Largo de São Francisco, em São Paulo, defendendo um programa de reforma das práticas políticas nacionais por meio da educação, do cumprimento das normas eleitorais, da garantia da integridade do voto e da implementação do serviço militar obrigatório. Isso inspirou a criação de associações patrióticas, entre elas, a Liga Nacionalista e a Liga da Defesa Nacional.

Nicolau Sevcenko descreve as celebrações do Dia da Bandeira como uma cerimônia realizada à noite. Com início na praça Antônio Prado, na qual uma procissão, ou marcha, de pessoas a entoar hinos se encaminhava até a Avenida Paulista. Seu final apoteótico se deu em frente ao monumento a Olavo Bilac, com uma visão privilegiada da cidade abaixo e um espetáculo de fogos de artifício. Sevcenko afirma que ‘A evolução de Bilac da poesia para a ação e a maneira como, por isso mesmo, ele foi transformado no ídolo da nova geração revelam claramente em que consistiu esse processo de mudança cultural’.

Após um breve período no qual o monumento foi elogiado, no entanto, iniciou-se uma campanha contra a obra. Existem diversos registros que mencionam o monumento como ‘feio’. Como por exemplo o Álbum Iconográfico da Avenida Paulista, de Benedito Lima de Toledo, e o dossiê ‘Exame res non verba’, publicado pelo jornal A Gazeta, que defendia sua demolição. Em fevereiro de 1935, o mesmo jornal anunciou a retirada do monumento a Olavo Bilac da Avenida Paulista em virtude de obras urbanas, ação celebrada pelo periódico : ‘O gesto do prefeito Fábio Prado somente merece aplausos (…)’. O monumento foi então fragmentado em seus diversos pedaços em bronze, levados para o Depósito Municipal da Várzea do Carmo, com sua coluna central de concreto sendo descartada. De acordo com Benedito Lima de Toledo ‘como Tiradentes, Olavo Bilac foi esquartejado’.

O Busto de Olavo Bilac

O Busto de Olavo Bilac permaneceu então no Depósito por cinquenta e dois anos, até ser reinstalado na praça da Av. Sargento Mario Kozel Filho, próximo do Círculo Militar no Ibirapuera, em 1988, por Jânio Quadros em seu segundo mandato na prefeitura da cidade. Para sua instalação, foi encomendado um novo pedestal, que eleva a figura de Bilac para um escala que afasta-o da dimensão humana, embora não retome a monumentalidade de seu posicionamento no monumento original. A implantação ressalta o caráter independente da obra, não sendo possível perceber que este originalmente pertencia a um conjunto escultórico. A área em que se encontra instalado é cercada por grandes, pertencente ao Comando Militar do Sudeste (II Exército), não permitindo a aproximação a partir da calçada. Em 1988, junto ao monumento é instalada uma placa de mármore na qual Bilac é descrito como patrono do serviço militar e príncipe dos poetas brasileiros.

A instalação da obra foi anunciada pelo jornal Folha de São Paulo à época, junto à reinstalação da estátua do Apóstolo São Paulo. No artigo ‘Prefeito devolve dois monstromentos a SP’, ressalta-se o papel da iniciativa privada no financiamento das obras de restauração e o caráter conservador de ambas as figuras, anunciando que a medida favorece a revisão de conceitos em torno da monumentalização na cidade. Ainda de acordo com o periódico, ‘parece unânime a descrença no valor artístico de todas as peças, unidas ou separadas, do monumento a Olavo Bilac (…) Mas sua importância enquanto signos – igual para os gregos e troianos, os militares do II exército que ficam com o busto ou os estudantes de Direito que ficam com o Beijo Eterno – parece fora de questão’.

Em 16 de dezembro de 2020, o Busto a Olavo Bilac foi restaurado, sendo inaugurado nas comemorações do Dia do Reservista. A data comemorativa foi instituída em 1939 por Getúlio Vargas na data de nascimento de Bilac, ‘para lembrar da importância do papel de cada brasileiro perante a Nação’, conforme afirma uma publicação do Comando Militar do Sudeste. Naquele momento, a placa instalada por Jânio Quadros foi substituída por nova placa em mármore. Nela se mantém o título de patrono do serviço militar brasileiro, acrescido na descrição ‘poeta e jornalista, foi compositor do Hino a Bandeira e membro fundador da Academia Brasileira de Letras’.

Em seu remanejamento, entre seu posicionamento inicial em um conjunto escultórico composto por diversas figuras representativas tanto de suas obras literárias quanto atividades cívicas, até os depósitos municipais, e por fim a área cercada do Comando Militar do Sudeste, a própria figura de Bilac se associa a diferentes signos e reivindicações, nas quais a própria forma de interação com o monumento, de um ponto de vista afetivo e como referência do sujeito no espaço urbano, se metamorfoseia.

Referências

  1. Giselle Beiguelman. Da cidade interativa às memórias corrompidas: arte, design e patrimônio histórico na cultura urbana contemporânea. Tese de Livre Docência apresentada à Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo, 2016.
  2. CMSE homenageia reservistas com busto de Olavo Bilac, Patrono do Serviço Militar. Página Oficial do Comando Militar do Sudeste, 16 de dez de 2020.
  3. Douglas Nascimento. Monumento a Olavo Bilac. São Paulo Antiga, 28 de mai de 2015.
  4. Prefeito devolve dois monstromentos a SP. Folha de São Paulo, 20 de abr de 1988.
  5. Fanny Tamisa Lopes. Cenografia e paisagem urbana: um estudo de caso na cidade de São Paulo. Dissertação apresentada à Universidade Estadual de Campinas, 2012.
  6. Nicolau Sevcenko. Transformações da Linguagem e Advento da Cultura Modernista no Brasil. Estudos Históricos, Rio de Janeiro, vol. 6, n. 11, 1993.
  7. Thaís Chang Waldman. Entre batismos e degolas: (des)caminhos bandeirantes em São Paulo. Tese de doutorado. Universidade de São Paulo. Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, 2018.

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